segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Do riso que puxa o anzol

Porque depois de meses sem voltar pra casa, chega aquele momento em que você se vê  em um carro em alta velocidade sem retrovisores e acelera ainda mais sem olhar para trás, não por medo ou ingratidão, mas porque depois de algum tempo na estrada você dá beijos no vento, descobre que a solitude, mais gostosa que a solidão, é a melhor enciclopédia de você. A saudade é redimensionada porque você percebe que, uma vez fora de casa, ela vai sempre ser parte da bagagem, por mais que ela sequer exista nos novos idiomas que você vai conhecer. O caso é que você deixa de ter círculos sociais e passa a conviver em aspirais sociais em constante movimento entre chegadas e partidas. Toda vez que a saudade chega, você sente gratidão por vê-la ligar pontas distantes que talvez nunca mais se conectem de novo fisicamente, embora sejam conexões que vão sempre reverberar no seu jeito de ser. 

No processo você aprende a se permitir, a resgatar partes obsoletas de você e a aceitar as novas. Quando o ângulo muda e você embarca nas novas perspectivas, começa a perceber que é possível ver mais mundo que supostamente caberia nos olhos, a conhecer mais gente que supostamente caberia na lembrança, a mostrar mais dentes que supostamente caberiam na boca, a viver mais do que supostamente aguentaria o coração.  O lábio tende a tremular no que alguns chamariam de felicidade. É o riso que puxa o anzol.

3 comentários:

El Siete Celeste disse...

Dentes vírgula muitos dentes

Andréia Félix disse...

Há mais mundo no mundo do que a gente possa imaginar, mas muitas vezes ficamos presos ao nosso mundinho e achamos que isso é tudo o que existe. Não é. Há muito para conhecer e desvendar. Só que requer coragem. Não é fácil sentir saudades.

Gislene Trindade disse...

Houve um tempo em que eu vi a saudade como ônus, hoje vejo como bônus. "Diga-me quantas tens e te direi o quanto viveu". rs..

Parafraseando, viver vai ser sempre um ato de coragem, Déia.